Dirigentes das dez
universidades federais mais novas do Brasil, incluindo o reitor da UNILA, Josué
Modesto dos Passos Subrinho, estiveram reunidos na Universidade Federal do ABC
(UFABC), na Grande São Paulo, no dia 15 de maio, para debater questões
relacionadas com o processo de criação e desenvolvimento dessas instituições. O
principal resultado desse encontro foi a elaboração da "Carta de Santo
André", direcionada ao Ministério da Educação (MEC), que lista os
principais desafios e projetos para o fortalecimento e crescimento das novas
universidades.
"Carta de Santo André"
Ao aprovar o Plano Nacional de Educação
(PNE) em 2014, o Governo Federal e o Congresso Nacional assumiram o compromisso
de melhorar e expandir a educação no Brasil. Das 20 metas do PNE, pelo menos
seis (a saber: as metas 12, 13, 14, 15, 16 e 20) dependem, para sua
concretização, de esforços substanciais das universidades federais. As metas
quantitativas definidas no PNE, porém, são extremamente desafiadoras,
considerando o atual tamanho da rede de instituições federais de ensino
superior (Ifes).
Sem
a criação de novas Ifes e a consolidação das que foram criadas nos últimos
anos, será muito difícil atingir as ambiciosas metas do PNE. Uma vez criadas,
essas instituições passam por um processo de construção e crescimento que
apresenta enormes dificuldades, que vão desde a construção física de suas
instalações e prédios até a consolidação de sua reputação acadêmica, bem como a
criação de seu portfólio de atividades de ensino, pesquisa e extensão. As
universidades novas enfrentam os mesmos desafios das consolidadas, além de
outros, particulares às instituições recém-criadas.
A situação particular das universidades
novas pode ser ilustrada pelo Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e
Expansão das Universidades Federais (Reuni), instituído pelo Governo Federal em
2007, com estimativa de investimentos de R$ 2 bilhões. Este exitoso programa de
fato conseguiu ampliar o acesso e a permanência na educação superior, criando
condições para que as universidades federais promovessem sua expansão física e
pedagógica, confirmando seu compromisso com a excelência acadêmica. Em 2007,
ano da instituição do programa, todas as então 53 universidades federais aderiram
ao Reuni, que vigorou até 2012. Foram criadas, ainda, dez novas universidades
federais que não participaram do Reuni, de modo que, em 2015, o número total
dessas instituições chegou a 63.
Surge
aqui, no entanto, um paradoxo: seja porque ainda não existiam, ou porque
estavam em fase muito inicial de suas atividades entre 2007 e 2012, essas
universidades novas, apesar de responsáveis por parte importante da expansão
estrutural e inovação pedagógica do ensino superior público, bem como por
missões temáticas e estratégicas de interesse nacional, não foram beneficiadas
pelos investimentos realizados no âmbito do Reuni.
Há
vários outros desafios comuns entre as universidades novas. A presente carta,
assinada pelas Reitoras e pelos Reitores das dez universidades federais que não
participaram do Reuni, objetiva apresentar, de forma concisa, os principais
desses desafios.
Neste
sentido, solicitamos especial atenção do Governo Federal, em particular do
Ministério da Educação (MEC) e de seus órgãos, e do Congresso Nacional, aos
seguintes assuntos:
Plano de Desenvolvimento das
Universidades
Apoiamos
a proposta da ANDIFES (Associação Nacional de Dirigentes de Instituições
Federais de Ensino Superior) de criação, pelo Governo Federal, de um Plano de
Desenvolvimento das Universidades (PDU), que
retome,
atualize e expanda o já encerrado Reuni. Este PDU deverá conter providências
específicas para garantir os recursos humanos e financeiros necessários para a
consolidação das universidades novas não contempladas no Reuni original.
Orçamento.
Reconhecemos o impacto da crise financeira e sabemos que todas as instituições
devem se adaptar à nova realidade. A educação, porém, não deve ser considerada
custo, mas, sim, investimento. Cortes no orçamento atingem todas as
universidades e prejudicam suas atividades, mas o impacto nas universidades
novas é particularmente nocivo, porque essas ainda estão construindo seus
prédios, bibliotecas, laboratórios, salas de aula e instalações de convivência.
As universidades novas correm o risco de permanecerem durante muitos anos com
prédios inacabados, alunos tendo aulas em instalações provisórias, servidores
tendo de improvisar para realizar suas atribuições e campi com aparência de
canteiros de obras abandonados. As universidades precisam de recursos
garantidos e suficientes para poder cumprir sua missão constitucional. As
universidades novas, em particular, necessitam desses recursos para poder
contribuir com sua parte no cumprimento das metas do Plano Nacional de
Educação.
Processo licitatório
Depois
de obter recursos, o próximo desafio é utilizá-los. Os procedimentos arcaicos e
morosos impostos pela Lei 8.666/1993 são incompatíveis com as necessidades de
instituições de ensino e pesquisa modernas, que devem reagir rapidamente à
criação de novos conhecimentos. A extensão do Regime Diferenciado de
Contratações (RDC) às universidades, por meio da Lei 12.722/2012, foi um passo
importante, mas insuficiente, no sentido de agilizar as contratações de
serviços e obras de engenharia pelas universidades. O impacto das inadequações
da Lei 8.666/1993 é particularmente grande nas universidades novas, que, em um
período de poucos anos, devem comprar 100% do seu parque de equipamentos e
instalações. Construir os prédios e comprar os equipamentos de uma universidade
inteira por meio dos procedimentos da Lei 8.666/1993 é uma tarefa hercúlea,
cuja execução absorve recursos humanos preciosos e alonga os prazos da
universidade em construção. De forma mais ampla, essa lei coloca todas as
universidades e instituições de pesquisa públicas brasileiras em desvantagem em
relação aos seus concorrentes internacionais, com consequências graves para o
desenvolvimento do país. Para reduzir essa desvantagem, sugerimos que as
modalidades de dispensa e de inexigibilidade de licitação sejam ampliadas para
essas instituições, que o RDC seja estendido para incluir, também, a
contratação de serviços que não sejam de engenharia e a aquisição de insumos e
bens de consumo das universidades e que seja agilizada a votação de projetos de
lei que modernizem as compras públicas.
Fundações de apoio
A
legislação vigente, com base na Lei 8.958/1994 e nos seus instrumentos
complementares, restringe fortemente as possibilidades para a criação e
operação de fundações próprias de apoio ao ensino, à pesquisa e à extensão
pelas universidades novas, o que as obriga a realizar a gestão de recursos e
convênios com pessoal próprio ou fundações externas. Essa situação onera ainda
mais as administrações já sobrecarregadas e coloca as universidades novas em desvantagem
com relação às antigas, que contam com o apoio de fundações próprias. Não
almejamos fundações pouco transparentes, muito menos a terceirização das
atividades fim da universidade, mas
precisamos
de fundações capazes de amparar as universidades no seu desenvolvimento
institucional e na sua interação do ensino, pesquisa e extensão com outros
atores da sociedade. A demanda, bem justificada, de muitas universidades
consolidadas é por uma nova forma de relacionamento com suas fundações de
apoio. O problema das universidades novas é mais básico: nenhuma das
universidades novas tem uma fundação própria. Faz-se necessária, portanto, uma
revisão da Lei 8.958/1994 e dos seus instrumentos complementares, para
viabilizar a criação de fundações de apoio transparentes e eficazes pelas
universidades novas.
Regiões remotas e economicamente
carentes
A
maioria das universidades novas, e também muitas universidades consolidadas,
atua no interior do país, frequentemente em regiões caracterizadas por
carências econômicas e diversidades étnico-culturais. Para as universidades
nessas condições faz-se necessário um esforço adicional, financeiro e
administrativo, para sustentar atividades de extensão e de inclusão social,
para promover sua efetiva interação com as regiões onde estão inseridas, bem
como contribuir com a melhoria das condições de vida da população local. Esse
esforço adicional deve ser reconhecido ao se quantificar os recursos humanos e
financeiros das universidades nessas condições.
Universidades temáticas e com missões
específicas
Algumas
das novas universidades foram contempladas com missões específicas,
relacionadas à internacionalização, à interiorização e integração de regiões
estratégicas do país. Essas importantes missões trazem consigo desafios
inerentes que não tem par na história brasileira, requerendo, portanto,
esforços administrativos e acadêmicos para além do que está previsto nos
modelos atuais de financiamento da Educação Superior.
Avaliação e regulação de cursos de
graduação com novos recortes
Muitas
das universidades novas criaram cursos com recortes inovadores, como
Bacharelados ou Licenciaturas Interdisciplinares (BIs e LIs). As métricas de
avaliação de cursos de graduação atualmente utilizadas pelo MEC foram
construídas para avaliar cursos disciplinares, logo, não se aplicam aos cursos
interdisciplinares. Por serem cursos de ingresso na universidade, BIs e LIs
apresentam grandes contingentes de alunos matriculados, além de características
peculiares, como grades flexíveis, incorporação de disciplinas de várias áreas
distintas do conhecimento e mecanismos de integração de cursos de formação
específica (como bacharelados tradicionais) ainda durante a formação
interdisciplinar. Para garantir uma avaliação adequada de cursos com recortes
inovadores, os instrumentos de avaliação e regulação do MEC e de seus órgãos,
tais como a SERES, a Capes e o INEP, devem ser revistos e atualizados, e os
avaliadores devidamente treinados.
Avaliação de cursos de pós-graduação
pela Capes e quantidade de bolsas
A
avaliação de cursos é realizada a cada quatro anos e atribui uma nota de 1 a 7
a cada curso. A nota inicial que permite o funcionamento de um novo curso é,
tipicamente, a nota 3, passível de aumento, em circunstâncias favoráveis, na
próxima avaliação. Considerando a periodicidade quadrienal das avaliações,
pode-se concluir que a nota é, ao menos em parte, uma medida da idade do curso,
não da sua qualidade intrínseca. Mesmo recebendo apenas avaliações quadrienais
positivas, uma universidade nova teria de esperar em torno de uma década e
meia até ter seu primeiro curso nota 7, independentemente da sua qualidade. Um
fator agravante é que o crescimento de cursos novos segue sua própria dinâmica,
com mudanças no corpo docente e nas instalações disponíveis em uma escala de
meses, mas que não são incorporadas na nota até a próxima avaliação quadrienal.
Sugerimos o estudo de mecanismos específicos de avaliação de cursos novos, tais
como avaliações intercaladas, alternando avaliações mais profundas a cada
quatro anos com avaliações de acompanhamento e atualização a cada dois, além da
possibilidade de a universidade solicitar uma avaliação de atualização fora do
cronograma. Ademais, é de fundamental importância a criação de uma política de
estímulo à criação de novos programas de pós-graduação nas novas universidades.
Outro problema é que a incorporação das bolsas do Reuni ao sistema de bolsas
Capes levou a uma grande assimetria entre o número de bolsas por instituições,
já que as universidades novas apenas têm direito à cota Capes original, sem
incorporação das bolsas do Reuni.
Matriz OCC
A
Matriz de Orçamento de Outros Custeios e Capital (Matriz OCC) foi criada pela
Portaria MEC nº 651/2013, como instrumento de distribuição anual dos recursos
destinados às universidades federais. Para levar em conta a situação distinta
existente entre universidades consolidadas e universidades em construção a
partir do zero, existe uma carência de 10 anos para aplicação dessa Matriz em
universidades novas. Sugerimos que esse prazo seja estendido a até 15 anos e
que a aplicação da Matriz OCC seja efetuada de forma gradual, acrescida de
fatores que considerem a porcentagem do espaço físico ainda em construção, a
distância entre a sede e os campi remotos, bem como a quantidade de campi.
Enfatizamos
aqui os desafios específicos das universidades novas e, por isso, não abordamos
demandas comuns a todas as universidades federais, consolidadas e novas, tais
como:
-
a elaboração de uma Lei Orgânica das Universidades, protegendo a autonomia
universitária;
-
a necessidade de garantir 10% do PIB para a educação; e
-
o compromisso inalienável com todas as metas do Plano Nacional de Educação.
Esta
carta constitui o documento inaugural do Grupo das Novas Universidades Federais
do Brasil, que visa ampliar a colaboração, criar parcerias, aproveitar
sinergias e alavancar o desenvolvimento do ensino superior no país.
Estamos
à disposição para colaborar, no cumprimento das metas do PNE e no detalhamento
das propostas acima elencadas, com todos os atores, entidades e órgãos
comprometidos com a educação no Brasil.
Prof. Dr. Klaus
Werner Capelle
Reitor da Universidade Federal do ABC
Reitor da Universidade Federal do ABC
Prof. Dr. Ricardo
Lange Ness
Vice-Reitor da Universidade Federal do Cariri
Vice-Reitor da Universidade Federal do Cariri
Prof. Dr. Jaime
Giolo
Reitor da Universidade Federal da Fronteira Sul
Reitor da Universidade Federal da Fronteira Sul
Prof. Dr. Aristeu
Rosendo Pontes Lima
Vice-Reitor da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira
Vice-Reitor da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira
Prof. Dr. Josué
Modesto dos Passos Subrinho
Reitor da Universidade Federal da Integração Latino-Americana
Reitor da Universidade Federal da Integração Latino-Americana
Profa. Dra. Iracema
Santos Veloso
Reitora da Universidade Federal do Oeste da Bahia
Reitora da Universidade Federal do Oeste da Bahia
Profa. Dra.
Raimunda Nonata Monteiro
Reitora da Universidade Federal do Oeste do Pará
Reitora da Universidade Federal do Oeste do Pará
Profa. Dra. Ulrika
Arns
Reitora da Universidade Federal do Pampa
Reitora da Universidade Federal do Pampa
Prof. Dr. Naomar
Monteiro de Almeida Filho
Reitor da Universidade Federal do Sul da Bahia
Reitor da Universidade Federal do Sul da Bahia
Prof. Dr. João
Crisóstomo Weyl Albuquerque Costa
Vice-Reitor da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará
Vice-Reitor da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará
Fonte: Caros Amigos
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